Presente de Grego

Antes do governo Juscelino, a Amazônia era inóspita e isolada. Sua sobrevivência tinha como base o extrativismo vegetal, a pesca e o comércio de peles de animais silvestres. Não conheciam a fome e eram raros os problemas com desnutrição. Sua população era predominantemente urbana e não era contada por metro quadrado, era por sesmaria.

Mesmo com a construção da rodovia federal ligando Belém à Brasília, o estado não conseguiu atrair imigrantes. Exceto um pequeno grupo de japoneses que havia chegado antes financiados pelo seu próprio governo e usaram com porta de entrada a capital do estado. Vieram em busca de sobrevivência e deram contribuição importante na agricultura e no comércio do estado do Pará.

Até o famigerado e temido golpe militar em meados da década de 60, “golpe este, hoje desejado”, a Amazônia não havia sofrido nenhuma ameaça de invasão, mesmo assim o governo federal, apoiando alguns governadores de estados localizados na região, lançou um apelo nacional com o slogan: “Integrar para não entregar”, na intensão de atrair para esta região totalmente desconhecida uma estirpe de homens que fossem corajosos, destemidos, dinâmicos, empreendedores, trabalhadores e experientes principalmente na difícil arte da pecuária. Seria mais fácil desbravar a Amazônia com pé de boi, pois, a terra era de altíssima fertilidade e alguns lobistas chagavam a dizer que o capim da espécie colonião nascia em qualquer lugar, tinha o triplo de massa com elevado teor de fósforo. Que o grão de milho era do tamanho de um salto de sapato. Que a cana caiana tinha o diâmetro de um litro. A região era mais promissora que Itapetinga (BA) e o Vale do Rio Doce (MG). O apelo foi convincente.

Esta estirpe de iludidos se compôs, principalmente por pecuaristas já estabilizados de todos os portes, pequenos, médios e grandes. Oriundos de várias regiões, principalmente sul da Bahia, norte de Minas e norte do Espírito Santo. Venderam tudo o que possuíam e muitos deixaram filhos estudando em grandes centros.

Trouxeram consigo, seus empregados, seus meeiros, seus agregados e alguns trouxeram também parte dos seus eleitores e amigos. Neste rol estavam ricos, pobres, analfabetos e doutores. Vieram carpinteiros, pedreiros, vaqueiros, médicos, advogados, engenheiros, dentistas, veterinários, topógrafos e animais de estimação. Escolheram o sul e o nordeste deste estado como sua terra prometida pela facilidade de acesso. Aqui chegando fundaram vilas, cidades, emanciparam municípios, construíram frigoríficos, laticínios e escolas. Trouxeram cultura e riquezas e em sua vã filosofia engrandeceriam o estado que acolheram.

Não estavam à procura de ouro, madeira, subsistência ou pratos para lavar. Viriam exercer a mesma atividade que lhes dera tradição.

Por outro lado, como prêmio, o governo cumpriu o prometido. Distribuiu títulos de propriedade indiscriminadamente sem referências, liberou financiamentos para desmatamento e queima de madeira sem aproveitamento algum através do Banco do Brasil, BASA e SUDAM envolvidos em vários programas como: PROTERRA, PROÁLCOOL e PROBOR, todos em vias de mão dupla, nada a fundo perdido. E reforçou o apelo, plante que João garante.

Sem competência de gerenciamento e fiscalização este governo acabou financiando em sua floresta uma verdadeira orgia ambiental aos seus convidados.

Muitos destes pioneiros usaram os financiamentos para outros fins ou voltaram para suas origens sem comprometimento algum.

Os mais sonhadores, que em sua ótica a Amazônia era uma partitura colorida apostaram na ilusão e só em meados da década de 70 os seus sonhos passaram a ser em preto e branco.

Descobriram que a terra tinha de altíssimo era o teor de acidez, que o capim da espécie colonião era de ciclo curto e não suportava pisoteio. Que o salto de sapato referente ao grão de milho era o do tipo Luiz XV. Que o litro era medida de volume.

Apesar do capim ser o único alimento bovino na região, os dois não se integravam. Ou se tinha um, ou o outro. Eram incompatíveis.

Mas como os financiamentos eram a longo prazo e existia a possibilidade de prorrogação, tentaram descobrir qual capim se adequava a região. Até que isto fosse possível, muito tempo e dinheiro foi gasto, muita divida foi paga, muitas perdoadas e algumas ficaram inadimplentes.

Muitos dos que quitaram suas dividas ficaram sem gás (idade e capital) para vencer a inércia além de enfrentarem uma inflação galopante. Ainda hoje existem filhos e netos destes pioneiros tentando conduzir suas pecuárias com o mesmo sistema integrado à agricultura no afã de aumentarem suas produtividades apesar da proibição do desmatamento e o desestímulo.

Já nos anos 70 o governo iniciou a construção de uma estrada ligando o nada a lugar nenhum denominada Transamazônica com o único objetivo de tirar suas tropas da ociosidade. E não lançou apelo algum para alguém participar de sua colonização. Simplesmente deu guarida aos retirantes da seca do nordeste custeando passagens, alimentação, moradia e insumos. Patrocinando desmatamento e degradação ambiental.

Esta estrada continua inacabada e faz parte do polígono de desmatamento irracional com baixa produtividade e altos índices de violência e conflitos.

No inicio dos anos 80 alguns integrantes da mesma sociedade extrativista que destruiu a Mata Atlântica e não conseguiram amealhar fundos suficientes, nem qualificar mão de obra para sobreviverem em suas origens, vieram para o Eldorado paraense entrando pela porta aberta pelos pioneiros pecuaristas sonhando em reeditarem o mesmo filme com final feliz.

Por ser uma atividade coletora não havia necessidade de grandes capitais para exercê-la. Como um garimpo vegetal. Partindo deste principio, logo, muita madeira serrada foi vendida mesmo antes de sua própria árvore ser tombada. Promoveu desenvolvimento, gerou emprego, renda e impostos. Após uma década o estado do Pará se torna o maior parque industrial madeireiro do planeta e se orgulha de sua degradação.

Grande parte da riqueza produzida foi pulverizada para grandes fábricas de tratores, caminhões e mau uso.

Após a entrada indesejável do governo como sócio na atividade, foi proibido a extração de madeira sem projeto de manejo “sustentado” a altíssimos custos. Custo este que era seu quinhão. Apesar da atividade já haver esgotado seus recursos de matéria prima, com raras exceções, este golpe do governo foi o tiro de misericórdia. A galinha dos ovos de ouro já estava morta, foi desnecessária a eutanásia. Alguns destes cidadãos que se capitalizaram e não aceitaram trabalhar na clandestinidade, serrando madeira ilegal, fecharam ou venderam a preços aviltantes suas serrarias e passaram a exercer outras atividades no comércio, na indústria e mesmo sem tradição se tornaram fazendeiros por falta de opção ou status. Outros que insistiram na ilegalidade foram multados, tiveram seus pátios de matéria prima confiscados, tiveram seus portões fechados ou faliram. Mas um pequeno numero se profissionalizou na atividade se tornando industrial madeireiro. (há de convir que o garimpeiro que queima e purifica o ouro não é industrial nem empresário). Este diminuto grupo agregou valores aos seus produtos, reflorestou, fez manejo sustentado, industrializou parte dos seus resíduos, educou filhos na área de interesse e estão se preparando para exercer a mesma atividade por várias gerações sem ter que emigrar, pois esta parece ser a última fronteira madeireira.

Nesta mesma década de 80 inicia-se o período do extrativismo mineral em grande escala com duas áreas em destaque, uma no sul do estado outra no oeste praticando desmatamento desordenado, assoreamento e poluição de rios. E o estado novamente deu asilo a excluído como na transamazônica.

Pouco sobrou do que gerou o ouro como riquezas e ainda promoveu o Uruguai ao maior produtor do metal da América do Sul sem de lá ser extraído um grama.

Sobraram as seqüelas: as invasões, os saqueamentos, a violência no campo e muito aumento. Aumentou o custo com assistência social, aumentou a mortalidade infantil, aumentou o analfabetismo, aumentou a população carcerária e só diminuiu a renda per capita e o IDH fazendo com que a sociedade criasse ojeriza a lona preta.

É nisto que dá o estado exportar ouro, importar pobre e castigar quem merecia ser promovido ou premiado. Como no caso Eldorado dos Carajás.

A década de 90 também teve participação neste imbróglio. Um escritor, intelectual e pecuarista com visão privilegiada de origem nordestina e proprietário de várias fazendas na região nordeste do estado do Pará, resolveu publicar em alguns jornais do sul do país um anúncio no qual ele disponibilizava para venda, aceitava sócios ou meeiros em qualquer uma de suas propriedades. Plagiou a mesma música da década de 60 mudando só o arranjo. Inseriu o soja. Poucas luas após este anúncio chega, ali, um desavisado agricultor à procura desta nova fronteira agrícola anunciada. Ledo engano, a sociedade não conhecia o fato nem consumia o produto. Falar em carne de soja era o mesmo que corda em casa de enforcado. Como não podia voltar, por motivos óbvios, resolveu apostar na megalomania de alguns empresários. Se associou a uma pequeno número de madeireiros e pecuaristas e com sua experiência plantou uma pequena área de 500ha a título de teste. O resultado desta prosopopéia todos conhecem, principalmente a receita estadual. Esta nova fronteira agrícola se expandiu por vários municípios visinhos e longícuos e produzem com eficiência soja, feijão, milho e arroz. O maior benefício foi no consórcio com a pecuária, viabilizando o setor com o aumento da produtividade e a taxa de desfrute.

Estamos no limiar de 2010, meio século de desmatamento e extração de riquezas, com o estado cada vez mais cultuando a pobreza da abundância.

Hoje só no estado do Pará conta-se mais de vinte projetos de mineração, a céu aberto, operados por grandes companhias com poder político na esfera federal, extraindo caulim, bauxita, ouro, ferro, manganês, cobre entre outros. E promovendo desmatamento degradantes, assoreamento de rios e outras agressões ao meio ambiente, que, com certeza serão irrecuperáveis. Seus funcionários graduados não sofrerão as conseqüências pois não são radicalizados no estado.

Prova que impera a hipocrisia.

Agora, este mesmo governo, desprovido de inteligência, parece também desmemoriado. Se esquece que todas as sociedades de pioneiros japoneses, pecuaristas, garimpeiros, madeireiros, agricultores e mineradores desmataram e poluíram a seu próprio modo. Alguns com seus financiamentos, outros com seu aval e muitos com sua ausência. E ainda por cima, como prova de sua incompetência, está obrigando a todos os proprietários de terras, cujos títulos lhes foram outorgados a fazerem o georreferenciamento de suas propriedades para que ele, o governo sem ônus, saiba onde se localizam tais áreas. Como se isto não bastasse, está enviando seus órgãos, sem conhecimento de causa, escoltado por policiais para multar e humilhar pecuaristas e agricultores que recuperam estas mesmas áreas degradadas com seus financiamentos no passado.

Áreas estas que, na sua maioria, não se encontram nas mãos dos mesmos donos. O que hoje é crime, não era na época dos incentivos. Foram desmatados 50% da área de algumas propriedades com financiamento Federais e Estaduais baseados na lei nº 4771 de 15 de setembro de 1965 e fiscalizada pelo IBDF. Produziram e integraram de acordo ao proposto por 36 anos na legalidade até a promulgação da medida provisória nº 2166.67 de 24 de agosto de 2001 sem poderes retroativos. Onde está o crime? Porque punir o atual proprietário e produtor? E quem vai punir os governos contemporâneos?

E não existem áreas ilegais, pois as que não foram tituladas e por culpa do INCRA e ITERPA que até hoje não sabem quais são suas jurisdições por pura incompetência. A mesma incompetência que esta demonstrando agora com o Georreferenciamento no Estado.

São dois pesos e duas medidas? O que justifica esta perseguição humilhante aos proprietários de terras nos municípios que mais evoluem e geram impostos na produção de grãos e carne? Crime pela ausência de votos? Neste caso, rejeição não é crime. É premio para os municípios.

Castigar a classe produtora de alimentos nestes municípios pode desencadear uma crise em outros municípios que dependem dos seus grãos para alimentação e rações. É com dar um tiro no próprio pé. Pode também faltar impostos para custear as doações de casas populares aos párias do MST que nunca mutaram como parasitas.

Só a título de informação. As vésperas das eleições para prefeito e vereadores do município de Paragominas, o Governo do Estado foi convidado a participar de um comício mesmo não sendo “companheiro”.

Já no palanque, seu representante não sabia absolutamente nada sobre o município. Não sabia que o município era um grande produtor de grãos do estado, não sabia que o município contribuiu substancialmente e foi um dos responsáveis pela 3ª maior renda de exportações do Estado. Não sabia que o município detém o maio numero de carteiras escolares proporcional a população estudantil. Não sabia que o município já é o maior reflorestador do estado atingindo a pequena soma de 100.000.000 de árvores. Não sabia que o município usa as melhores tecnologias de reprodução na pecuária de corte e tem a melhor taxa de desfrute do Estado. Não sabia que Paragominas dista 300 km da capital e a usa como entreposto comercial. Não sabia que seu nome homenageia o Estado. Não percebeu que sua população tem orgulho dela e demonstrou isto nas urnas.

Mas vai continuar sem saber por falta de conhecimento. Não por descaso.

Este mesmo produtor que dá louros ao seu estado através de impostos, emprego e geração de divisas está sendo taxado de oportunista, aproveitador, especulador e outros títulos pejorativos, mas não pode ser taxado de incompetente nem preguiçoso. Continuam produzindo e citando Ozimandias:

Olhem para os meus feitos pujantes, e desesperem-se.


Há de chegar o dia em que respeitarão as mãos que os alimentam.

A minha conclusão não é um parabéns, nem poderia, apesar de ser adotivo com direito a herança critico a sociedade papa – chibé por colocar no mesmo saco os primeiros pioneiros. Se era para castigar, por que premiou?

Em retribuição, ao presente de grego, estes pioneiros conseguiram elevar de tal modo a pecuária do estado que hoje ela é respeitada dentre as melhores e maiores do país e figura no terceiro lugar em sua pauta de exportações. Isto falando na pecuária que foi o propósito principal da primeira sociedade pioneira. Sem contar que seus filhos não engrossam indigência de periferia, não tem índice medido em presídio, não são camelôs, não estão sob lona preta, não morrem em hospitais públicos nem recebem cestas básicas. Por outro lado dá para medir suas contribuições como cientistas, advogados, médicos, veterinários, engenheiros e até ambientalistas. Todos formados e/ou graduados nas faculdades existentes no estado. Este mesmo estado que doa concessão de rádio difusora a prostitutas e financia com o erário a difusão de suas experiências.

É bom que refaçam seus conceitos e tomem como exemplo esta sociedade tupiniquim. Se houve culpados, dê-lhes a menor pena, mas respeite-os. Não se surpreendam se forem governados por um descendente desta estirpe.

Parabéns ao Deputado Giovanni Queiroz pela coragem

Comentários

Presente de grego é um soco no estômago. Nossa distante visão aqui do sul não percebe os detalhes e a real imagem quando "autoridades" ficam a frente e ofuscam o país produtor sério, que não mama nas tetas, que não reza a cartilha das estrelas. Todos os governos, até agora se monstraram incapazes até de conhecer suas terras e seu povo. Mas o atual faz escola em bizarrices, aprimorando os passados.

Em tempo. Deveria ser óptica o nome correto do local de venda de óculos. Não conheço até hoje uma explicação para esse erro.

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