O Poder da escolha
Quando estudiosos perguntam
por que um homem saca de uma faca e apunhala outro até a morte, a resposta
religiosa aceitável é; por que ele fez esta escolha. Usou seu livre arbítrio
para escolher o caminho do crime. É este livre arbítrio que o torna responsável
pelo ato.
No século passado, quando os
cientistas abriram a caixa preta do homo
sapiens, não acharam lá nenhuma alma, um livre arbítrio e nem um “eu”. Os
processos eletroquímicos no cérebro que resultam em assassinatos são, ou
determinísticos, aleatórios ou uma combinação dos dois, mas nunca são livres.
Geneticistas e neurocientistas
darão uma resposta mais detalhada para o ato. Quando um inútil puxa uma faca e
atinge um político, ele fez isto devido a uma série de processos eletroquímicos
no cérebro que foram configurados por uma formação genética específica que é o
reflexo de antigas pressões evolutivas aliadas a mutações casuais. As pessoas
continuam a insistir no livre arbítrio por que a sociedade ainda faz uso de
conceitos teológicos desatualizados. Cristãos, judeus e muçulmanos debateram
durante séculos as relações entre a alma e o desejo. Pressupõem que todo ser
humano têm dentro de si uma alma que é seu verdadeiro “eu”, e que este eu é
detentor de vários desejos que são responsáveis pelas suas escolhas. ”Se as
escolhas forem por bons desejos, terão o céu como prêmio. Se as escolhas forem
por desejos ruins, serão enviados para o inferno”...
Eva desejou comer do fruto
proibido?... Este desejo lhe foi imposto?...
Será que este desejo surgiu dentro dela por acaso, ou ela o escolheu
livremente?.. Se Eva não escolheu comer do fruto livremente, por que puni-la
por isto?.. Não faz sentido um pecado original. Uma punição pela existência.
No entanto, uma vez aceito que
não existe alma, nem um verdadeiro “eu”, não faz sentido perguntar: “Como é que
eu escolho meus desejos”.. Na realidade, o que existe é um fluxo de consciência
e os desejos surgem e passam por seu interior sem que exista nenhum eu dono
destes desejos.
O livre arbítrio, nada mais é
do que uma emenda constituída para inocentar Deus das más ações.
Você passa metade da sua vida
produtiva trabalhando de sol a sol, economizando para comprar um carro popular
para, com alegria, dar conforto e lazer para sua família. Este carro foi o
fruto das suas escolhas. Parabéns!!! Só não entendo a frase no vidro. “Presente
de Deus”.
Não obstante, um contemporâneo
seu, sofreu um acidente de trabalho que o tornou paraplégico e devido ao
sinistro ele e sua família passa por dificuldades. Hoje sua locomoção se dá através de uma
cadeira de rodas. Sua falta de atenção
no trabalho foi fruto do seu livre arbítrio? Não vi a frase “Presente de Deus”
no encosto da cadeira de rodas. Sabe por
que?... O livre arbítrio é uma hipocrisia cristã.
Comentários
As tuas provocações continuam afiadas. Eu entendo diferente a questão da liberdade. Acredito que "ser livre" esta indissociável da nossa condição humana. A vida são feitas de escolhas e desejos que provocam escolhas. Ainda que tais escolhas sejam condicionadas, elas são escolhas e o ato da mente humana em se vê condicionada, já é um sinal inequívoco de liberdade em sua essência. Uma essência que de fato está presa, moldada, construída por fatores outros até inconscientes mas quando eu percebo esse condicionamento, crio o entendimento da liberdade essencial que me é negada por mim mesmo.
“DESCONSTRUINDO ESSAS MENTIRAS QUE NOS CONTARAM A VIDA TODA”
Conceitos freudianos, construídos a partir da ilusão infantil ou superficial ligada à imagem e às aparências identitárias em um mundo que falsamente imaginamos girar em torno de nós (Narcisismo), foram revisitados por Jessé de Souza, para embasar sua recente obra ─“A Classe Média No Espelho” ─ Editora Estação Brasil.
Replico abaixo, com os devidos créditos, três trechos maravilhosos do escritor, sociólogo e professor universitário (agora, psicólogo de nossa sociedade) Jessé Souza, pinçados da Introdução de seu provocador livro:
“Tais mentiras são de dois tipos. No primeiro, com o intuito de sermos mais domináveis, somos induzidos a nos ver como homens e mulheres excepcionalmente capacitados. Esta é a grande cilada do liberalismo hegemônico, o pressuposto implícito de todas as ciências ensinadas nas universidades. Segundo ele, somos ‘indivíduos’ autômatos e livres, que vivem num mundo transparente e claro”.
“[…] A falsidade dessa ideia é de fácil demonstração, como se verá. Mais importante é saber por que sendo falsa e superficial, todos nós preferimos acreditar nela. O motivo é simples: ela estimula nosso narcisismo infantil, ou seja, o desejo de nos vermos como fortes inteligentes e poderosos. A felicidade está logo ali na esquina, e depende apenas de nossa vontade livre e autônoma para ser conquistada”.
Abçs, Levi B. Santos